Jurisdição Internacional: Princípio da Dúvida e Consentimento


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Introdução

Critica-se, por vezes, a interpretação conservadora que a Corte Internacional de Justiça tem de sua própria jurisdição, ou o “tempo” que seus juízes empregam debruçados nos estudos aprofundados das objeções de inadmissibilidade e de ausência de jurisdição; tais críticos da posição da Corte sustentam que a preocupação excessiva com formalidades sobrepuja o mérito das questões substanciais submetidas a seu julgamento, e afirmam que a Corte deveria ter uma posição mais de vanguarda quanto à sua própria jurisdição, aumentando o seu alcance compulsório da competência subjetiva (ratione personae) relativa ao (2) do Artigo 36, vale dizer, sobre os Estados, já que é inconteste o amplo espectro de competência objetiva ratione materiae da Corte, à luz do Artigo 36 (1) de seu Estatuto.

Nesse post, explicamos o princípio da dúvida, sua aplicação pela Corte Internacional de Justiça (CIJ), talvez, a mais grandiosa dos órgãos adjudicatórios da Justiça Internacional, citamos a sua ratio essendi e apresentamos uma conclusão de acordo com a visão que temos da questão.

Como sempre se realça, o objetivo dos posts não é de uma pesquisa aprofundada capaz de firmar uma posição ou outra no cenário doutrinário rico e sofisticado do Direito Internacional, mas de servir de reflexão e, sobretudo, captação de interesse dos operadores brasileiros do direito pela Justiça Internacional, informando do prestígio que sua prática, conhecimento e desenvolvimento pode render para o Brasil nas relações internacionais.

O Princípio da Dúvida. Aplicação Universal no Direito Processual. Concepção da Dúvida em Razão do Princípio do Consentimento na Jurisdição Internacional

É sabido que, judicialmente, o ônus da prova cabe a quem faz a afirmação do fato. O sopesamento daquele ônus é feito a partir do princípio universal da dúvida, a  qual se distribui proporcionalmente à razão da natureza do direito aplicável pelas cortes, essencialmente, conforme seja a jurisdição civil ou criminal.

No Direito do Sistema Common Law, que influi o Direito Internacional mais do que o Direito Romano, o mais alto nível do ônus da prova é o da evidência do fato além da dúvida razoável (beyond a reasonable doubt), aplicável à jurisdição penal, pois o acusador deve demonstrar o fato da culpa criminal com provas que não deixam uma dúvida superior a 2%. Esse mesmo percentual cai para pouco mais de 50% na jurisdição civil, na qual se aplica a regra do preponderance of evidence (preponderância da prova). As Cortes Internacionais seguem esse padrão.

Nada obstante aquela concepção quase simétrica de dosagem finalística de ônus de provas entre o Direito Doméstico dos Estados (em sua grande maioria) e a Jurisdição Internacional nas ações de natureza penal e civil, o princípio da dúvida é implementado diferentemente conforme se trate de uma decisão sobre a existência ou não da jurisdição no âmbito doméstico e internacional. É as cortes domésticas reconhecem, na dúvida, a existência de sua jurisdição, ao passo que as cortes internacionais, na dúvida, rejeitam a sua jurisdição, conforme a jurisprudência da CIJ.

Assim, por exemplo, em um conflito de jurisdição entre uma corte brasileira e uma corte alemã sobre um tema objeto de Direito Internacional Privado, na dúvida, as cortes internas firmam a sua jurisdição em detrimento da contraparte estrangeira, porque, no direito doméstico, a jurisdição, sendo um dos Poderes do Estado de Direito, tira sua seiva da soberania que se orienta em um movimento centrípeto, isto é, centralizando o poder do Estado de modo a torná-lo o mais absoluto como fonte de poder sobre seus cidadãos.

Por isso, no confronto entre as cortes de diferentes Estados pela jurisdição, ambas tenderão – na dúvida se há ou não jurisdição – a pender para a existência do poder jurisdicional, fortalecendo, portanto, as amarras da soberania sobre indivíduos, bens e relações no seu território, com exclusão da jurisdição alienígena, salvo as exceções a respeito das quais não haja dúvida.

Por outro lado, o princípio da dúvida, recebe inversa vocação na jurisdição internacional: Havendo incerteza, nega-se a existência da jurisdição, já que a direção do movimento da soberania também é oposta,centrífugo. De fato, os organismos internacionais judiciais são criados pelos Estados que os instituem, em certa medida, mediante a renúncia de sua soberania, já que se sujeitam a sofrer a interferência da Justiça Internacional, muitas vezes, em assuntos sensíveis de interesse deles, tais como seus limites territoriais ou marítimos.

Aquela renúncia de poder a favor dos órgãos judiciais internacionais apenas legitima a atividade adjudicatória pela estrita interpretação do princípio do consentimento que, por seu turno, dá força ao princípio da obrigatoriedade dos ajustes internacionais (sanctity of treaties), equivalente ao pacta sunt servanda. Verifica-se, dessa maneira, que a soberania move sua autoridade dos Estados que a detêm para as instituições estrangeiras (sentido centrífugo do poder).

As Cortes Internacionais interpretam o consentimento nos contratos internacionais que afetam a sua soberania como uma “doação pura de seu poder” a favor dos organismos internacionais, de modo que os donatários devem interpretar a liberalidade com parcimônia. Portanto, diante da dúvida, na Justiça Internacional, os órgãos adjudicadores das disputas que envolvem soberanias tendem a declinar o julgamento, dando-se por incompetente.

Tema de Alto Interesse na Orientação da Universidade de Londres 

Trata-se de tema de relevância acadêmica. Na Seção C (Papel e Funcionamento das Cortes e Tribunais Internacionais: Aspectos Institucionais) do Curso Lei e Política das Cortes e Tribunais Internacionais, observa-se que a Universidade de Londres atribui especial atenção sobre a importância de como a Corte Internacional de Justiça (CIJ), o principal órgão judicial das Nações Unidas, relaciona-se com a questão da compulsoriedade de sua jurisdição sob o aspecto da legitimidade subjetiva (artigo 36, § 2º, Estatuto da Corte). No sentido dessa crítica, a CIJ é comparada a rigidez da jurisdição de outras grandes cortes internacionais globais, como o sistema judicial vigente na na Organização Internacional do Comércio. Questiona-se, a teor da mesma crítica, a razão pela qual a aderência ao Estatuto da Corte Internacional de Justiça não deflagra a automática compulsoriedade de sua jurisdição, a exemplo do que acontece em todos os outros sistemas, por exemplo, da Corte Internacional Penal (por adesão ao Estatuto de Roma de 1998) ou pela adesão à Convenção da Lei do Mar da ONU de 1992, que submete o Estado aderente ao sistema judicial dela.

A Posição Conservadora da Corte Internacional de Justiça sobre Sua Jurisdição

O discurso do Presidente da ICJ, por ocasião da 76ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, Joan E. Donoghue, em 28 de Outubro de 2021, apontou a importância do respeito dos julgamentos da Corte ao reconhecimento de que sua jurisdição sobre os Estados se limita estritamente ao princípio de seu consentimento:

“Ao considerar questões de jurisdição, a Corte está ciente de que sua autoridade depende, entre outras coisas, do respeito inabalável aos limites de sua jurisdição, uma vez que o Estatuto da CIJ fez do consentimento uma pedra angular da estrutura jurisdicional. Tanto a estrutura processual quanto a sua interpretação substantiva das questões jurisdicionais refletem esta prioridade.”

Joan E. Donoghue

Como indicamos adiante, o conversadorismo da Corte Internacional de Justiça sobre sua jurisdição minimamente compulsória é herança da corte antecessora, a Corte Permanente de Justiça Internacional.

Princípio da Certeza na Restrição Essencial da Soberania

Na realidade, data de muito tempo a interpretação não-extensiva da manifestação de vontade dos Estados nos tratados ou convenções internacionais, quando esses estabelecem restrições à soberania dos contratantes, e não se limita a um entendimento de interpretação das convenções apenas para efeito de efetivação da jurisdição como um meio obrigatório de solução de disputas (por tribunais judiciais ou arbitrais), mas também para outros aspectos que podem advir das convenções para a soberania dos Estados delas contraentes.

À luz dessa concepção, no julgamento arbitral do Caso Lanoux2, o Tribunal Arbitral de Viena, em 16 de Novembro de 1957, interpretando a cláusula 11 do Ato Adicional (Regime e Fruição de Águas de Uso Comum entre os Dois Estados) de 26 de Maio de 1866, da Convenção de Bayonne, sustentou que a referência à prévia notificação não implicava haver o Estado Francês concedido ao Estado Espanhol, como entendeu esse, um poder de veto sobre o poder francês de administrar seus negócios em seu território, ainda que sobre águas cujo uso era comum dos dois países, cada qual em seu próprio território no exercício de sua própria soberania. [em português, a passagem do julgamento que determina sejam interpretadas restritivamente cláusulas em convenção que coloquem restrição à “jurisdição” dos Estados. Observa-se que “jurisdição” é empregada no julgamento como “poder soberano do Estado”, e não como “juris dictio”, isto é, “dizer o direito”, de acordo com a origem latina da palavra e na interpretação mais apropriada juridicamente, i.e., a atividade estatal típica do Poder Judiciário, ao qual incumbe interpretar as leis e aplicá-las aos fatos].

Ficava, assim, estabelecido o princípio de que depende da certeza a interpretação de que um Estado, através de seu consentimento, quis criar uma restrição à sua soberania, por exemplo, permitindo que outro Estado pudesse exercer um poder de veto sobre o exercício de sua autoridade no seu próprio território.

O princípio da certeza (sobre a existência de uma acordada restrição essencial à soberania de um Estado) tem razão siamesa ao do princípio da dúvida sobre haver um Estado aberto mão de sua soberania para decidir pelos meios diretos diplomáticos (negociação), ou indiretos (mediaçao, inquirição, bons ofícios e conciliação), para aceitar uma resolução de disputa obrigatória pela decisão de uma terceira parte adjudicadora (o tribunal judicial ou arbitral).

Ônus da Prova na Objeção de Ausência de Jurisdição

Visto ser entendimento consolidado da CIJ que, na dúvida, ela declinará de sua competência em homenagem ao princípio do consentimento, o que reforça a sua legitimidade internacional, a questão que se põe agora é de quem é o “ônus da prova” da ausência de jurisdição? De quem a alega, no caso, o Estado requerido?

A questão é de grande interesse porque as objeções contra a jurisdição são, praticamente, recorrentes em todas as defesas em ações que não venham fundadas no artigo 40 do Estatuto da Corte, especificamente, mediante notificação de acordo especial, ou seja, aquelas situações em que, em face de uma disputa, os Estados realizam um acordo específico (especial), o special agreement, pelo qual expressam que vão levar a solução da causa à Corte. Por exemplo, no caso da Plataforma Continental do Mar do Norte, envolvendo, de um lado, o Reino das Terras Baixas e Dinamarca e, de outro, a Alemanha.

Em célebre julgamento produzido no caso Border and Transborder Armed Actions3 (Nicaragua v. Honduras), Jurisdiction and Admissibility, a Corte Internacional de Justiça nos traz importantes lições. A primeira é que, em sua defesa, Honduras aduziu que a ação proposta pela Nicarágua era inadmissível e que a Corte era incompetente. Ao julgar, porém, a Corte inverteu as ordens de apreciação das defesas preliminares: Primeiro, a Corte quis se certificar de que havia competência (especificamente, jurisdição) para, então, verificar que havia admissibilidade. Ou seja, a Corte tratou de seguir uma ordem lógica, pois “perderia tempo” analisando a admissibilidade para, então, concluída ser admissível a ação, partir para um exame de sua própria jurisdição sobre o caso e, no entanto, chegar ao resultado de que não tem jurisdição!

Todavia, já aconteceu de em vista de objeções de inadmissibilidade e jurisdição, tendo a Corte uma “previsão” de que tem jurisdição mas a causa não é admissível, o julgamento não seguiu a ordem lógica para se ater a uma ordem mais prática, rejeitando a Corte a aplicação primeiramente, a fim de não empregar tempo na análise de uma jurisdição certa para, só então, debruçar-se sobre uma aplicação que, ictu oculi, já podia prever que era inadmissível. Essa “inversão necessária da lógica por uma necessidade prática” se verificou no caso Interhandel, Suíça v. Estados Unidos, de 21 de Março de 1959, a respeito da qual comentou FITZMAURICE4, em sua opinião em separado em outro processo, relativo ao caso Northern Cameroon v. United Kingdom, no julgamento de 2 de Dezembro de 1963:

“Veja-se o caso Interhandel (Jurisdição), I.C.J. Reporte 1959, p. 6, no qual a presente Corte acolheu um pedido de inadmissibilildade, embora uma objeção à sua jurisdição estive ainda pendente, e da qual jamais dispôs. O resultado imediato é o mesmo, mas não necessariamente a longo prazo; porque uma objeção de jurisdição exitosa necessariamente extingue o assunto de uma vez por todas, enquanto alguns pedidos de inadmissibilidade (por exemplo, recursos locais que não tenham sido exauridos) relacionam-se com defeitos que pode ser sanados pela conduta subsequente da parte interessada.”

Juiz Gerald Fiztmaurice

Inadmissibilidade e Jurisdição: Tratamento e Efeitos Processuais da Distinção (Prova e Natureza da Extinção)

A diferença entre inadmissibilidade e jurisdição tem recebido maior atenção no âmbito do sistema judicial do Centro Internacional para a Resolução de Disputas de Investimentos (ICSID), porque o artigo 41 das Regras de Arbitragem do Centro faz minuciosas disposição de objeção relativa à jurisdição, à competência e à aplicação (ou seja, admissibilidade). A leitura do post Procedural Rules in International Law: Understanding Jurisdiction, Competence, and Admissibility complementa essa leitura porque adiciona informações sobre os conceitos de jurisdição, competência e admissibilidade. Ainda, é relevante a leitura do post Objections in the ICSID´s Legal System, no qual aqueles mesmos conceitos são visitados à luz da legislação aplicável pelo Centro Internacional de Resolução de Disputas de Investimento entre Estados e Nacionais de Outros Estados.

A importância da distinção entre os institutos da objeção de inadmissibilidade e de jurisdição reside no fato de que a alegação de inadmissibilidade repousa em fatos que o Estado arguente deve evidenciar, é seu ônus provar, porque a inadmissibilidade centra-se imediatamente em fatos e, consequentemente, incide a regra geral de que o ônus da prova dos fatos cabe a quem alega os fatos. Por exemplo, a objeção de que o procedimento adjudicatório se iniciou precipitadamente, em desrespeito à cláusula da convenção que obriga a tentativa prévia de autocomposição, incumbe ao Estado requerido provar, não a ausência de prévia autocomposição, naturalmente, porque não se pode impor a prova de fato negativo, mas a existência de obrigação de prévia autocomposição infringida, que é o fato constitutivo do direito alegadamente descumprido.

Por outro lado, a objeção de jurisdição, que se ampara em fatos mais remotos, não exige prova dos fatos, de modo que não há ônus de prova dos fatos ao Estado requerido que levanta a objeção da jurisdição.

Nesse sentido, a respeito do ônus da prova na análise de uma objeção de ausência de sua jurisdição, no julgamento do Caso das Ações Armadas nas Fronteiras e Além das Fronteiras entre Nicarágua e Honduras, § 16 (Case concerning Border and Transborder Armed Actions – Nicaragua v. Honduras), a Corte Internacional de Justiça se pronunciou no seguintes termos, em 20/12/1988, invocando um precedente da antecessora Corte Permanente de Justiça Internacional, julgado em 26/7/1927, nos seguintes termos:

“As partes devotaram algum argumento para a questão como sendo aquela do ônus da prova: Se é para a Nicarágua demonstrar a existência de jurisdição para a Corte lidar com os pedidos, ou para Honduras estabelecer a ausência de tal jurisdição. Cada uma delas tem citado, em apoio à sua alegação, o dito da Corte de que “é o litigante que procura estabelecer um fato que suporta o ônus de prová-lo” (Military and Paramilitary Activities in and against Nicaragua (Nicaragua v. United States ofAmerica), I.C.J. Reports 1984, p. 437, para. 101).

A existência da jurisdição da Corte em um dado caso é, porém, não uma questão de fato, mas uma questão de direito a ser resolvida à luz dos fatos pertinentes. A determinação dos fatos pode surgir de questões d prova. Contudo, os fatos no presente caso – a existência das declarações das Partes sob o Artigo 36 do Estatuto, a assinatura e ratificação do Pacto de Bogotá, etc. – não estão em disputa; a questão é, quais são os efeitos legais a serem ligados a eles? A questão é se no caso de dúvida a Corte deve se considerar que tem jurisdição ou não. Essa questão já foi considerada pela Corte Permanent de Justiça Internacional no caso concernente ao Factory at Chorzów, Jurisdição, quando ela observou: “tem sido argumentado repetidamente no curso do presente procedimento que em caso de dúvida, a Corte deve declilnar da jurisdição. É verdadeiro que a jurisdição da Corte é sempre uma jurisdição limitada, a qual existe somente à medida que os Estados a tenham aceito; consequentemente, a Corte, no evento de uma objeção – ou quando ela considera automaticamente a questão – apenas afirmará sua jurisdição desde que a força dos argumentos que militam em favor dela é preponderante. O fato de que importantes argumentos podem ser desenvolvidos para apoiar a defesa de que ela não tem jurisdição não pode criar uma dúvida premeditada para derrubar sua jurisdição. Quando considerando se tem jurisdição ou não, o objetivo da Corte é sempre se certificar se existe intenção da parte das Partes em conferir a ela jurisdição.” (P.C.I.J., Series A, No. 9, p. 32.) A Corte, portanto, nesse caso terá de considerar se a força dos argumentos que militam em favor da jurisdição é preponderante, e “se certificar se existe uma intenção da parte das Partes em atribuir jurisdição a ela”.

CIJ

Ademais, o princípio da dúvida milita a favor da ausência de jurisdição, não sendo aplicável à falta de admissibilidade. Enfim, como lembrou o Juiz GERALD FITZMAURICE em sua opinião em separado, no caso Northern Cameroon v. United Kingdom, julgado em 2 de Dezembro de 1963, a inadmissibilidade é remediável pelo Estado autor, ao passo que a ausência de jurisdição acarreta a extinção peremptória do caso.

Conclusão

A jurisprudência da Corte Internacional de Justiça, historicamente, desde sua antecessora, a Corte Permanente de Justiça Internacional, é orientada à interpretação restritiva de sua jurisdição na questão da competência subjetiva (ratione personae), em função do princípio de que, na dúvida, a soberania estatal deve ser deixada íntegra, já que a submissão de uma disputa ao julgamento internacional impõe ao Estado uma solução obrigatória, qual não deve ser imposta sem a prévia certeza de que houve consentimento do Estado se subjugar.

Assim, a CIJ destoa das demais cortes globais e regionais, porque o Estado pode aderir ao seu estatuto, mas nem por isso aceitar a jurisdição compulsória da Corte incondicionalmente. De fato, sendo ratio essendi da posição jurisprudencial da Corte o prestígio ao princípio do consentimento e ao da certeza nas restrições essenciais de soberania em cláusulas convencionais, esse posicionamento também se mostra sabiamente integrativo da necessidade de equilíbrio do amplo espectro da competência ratione materiae do § 1º, do Artigo 36, do Estatuto, com o reduzido elastério da competência ratione personae do § 2º, do mesmo artigo.


  1. O pdf do julgamento se encontra abaixo para download ↩︎
  2. Judgment, Z.C.J. Reports 1988, p. 69. O pdf para download se encontra abaixo ↩︎
  3. Abaixo, o PDF da Manifestação em Separado do Juiz, no julgamento Northern Cameroons v. United Kingdom. ↩︎


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