Qual a Utilidade da Advocacia em Justiça Internacional
Justiça Internacional (ou Adjudicação Internacional) é uma especialidade em Direito Internacional.
Assim, a utilidade de uma consultoria, assessoria, representação legal ou advocacia em Justiça Internacional reside, especificamente, em face de questões internacionais, tanto na assessoria e consultoria quanto no contencioso propriamente, quando é feita a representação nas Cortes e Tribunais Internacionais (intergovernamentais ou arbitrais) pelo Advogado especializado em Justiça Internacional (ou Adjudicação Internacional). Note: Justiça Internacional e Adjudicação Internacional são a mesma especialidade, a distinção é só de interesse acadêmico.
Como a especialidade de Justiça Internacional é um conhecimento agregado ao profissional de Direito (a nível de Mestrado), o profissional especializado em Justiça Internacional é também conhecedor do Direito Internacional (Público e Privado) e ainda, no topo disso, tem o domínio de algum Direito Doméstico. No nosso caso, os Direitos Domésticos que advogamos é o Direito do Brasil e o Direito de Portugal. Também advogamos no Direito Comum Europeu; porém, ele é considerando Direito Internacional Privado.
Logo, a grande utilidade da advocacia especializada em Justiça Internacional é que esse profissional também é o mais qualificado para lidar com as questões extraterritoriais.
A experiência revela que nem sempre as pessoas reconhecem que estão, efetivamente, diante de uma questão de Justiça Internacional (Adjudicação Internacional), devido à proximidade dela com a extraterritorialidade, especialmente, nas situações de domínio do Direito Internacional Privado. Logo, convém consultar o profissional jurídico especializado em Justiça Internacional sempre que a pessoa se deparar com uma dúvida, necessidade de aconselhamento ou assessoria em fatos que tenham internacionalidade.
Fatos que tenham internacionalidade são todos aqueles nos quais existe alguma ligação de fato, de direito ou circunstancial com outros países, tais como leis de outros países, pessoas de outros países, viagens a outros países, aquisição de bens e serviços em outros países ou de prestadores e ou fornecedores de outros países, ainda que no seu próprio país, fatos acontecidos em outros países ou no seu próprio país, mas com repercussão ou efeito em outro país etc.
Por exemplo, um caso recente que atendemos consistia no fato de uma cidadã da Federação Russa que, no Aeroporto de Guarulhos, foi ofendida e impedida de embarcar em um voo do Brasil para a Alemanha operado por um transportador aéreo que presta serviços no Brasil. Nesse caso, existe extraterritorialidade, mas não exatamente uma internacionalidade técnica, porque o direito aplicado é o do Brasil, e não o Direito Internacional, e o caso é julgado por uma Corte brasileira. Todavia, a extraterritorialidade do evento traz ao caso a aplicação de alguns diplomas de direito internacional privado.
Consequentemente, a advocacia de Justiça Internacional constitui uma especialização a ser considerada pela pessoa diante de internacionalidade. Assim, o especialista em Justiça Internacional poderá definir se é caso de Justiça Internacional, de Justiça Doméstica (e de qual Estado) e, ainda, se há necessidade de invocação de direito internacional público ou privado para o caso!
Comércio Exterior e Justiça Internacional
No sentido mais amplo, na atividade de Justiça Internacional se inserem problemas de comércio exterior, já que, como prática, as disputas de comércio internacional são levadas aos tribunais arbitrais que, por sua vez, aplicam o direito internacional privado.
Ademais, por ser a advocacia de Justiça Internacional focada na prospecção de disputas, a assessoria, consultoria e aconselhamento desse profissional para o departamento de Comércio Exterior das tradings podem ser de alta valia, nomeadamente, na perspectiva de gestão de riscos.
Tal como se diz na doutrina dos acidentes (aéreos), por vezes, o gestor empresarial “acha que custa caro” a empresa “investir em segurança de voo”, até que, desafortunadamente, o transportador aéreo experimenta as “consequências de um acidente aéreo”, incomparavelmente muitíssimo mais caras que ter investido na segurança. A mesma percepção de ideia se aplica às milionárias transações internacionais.
Para efeito de ilustração, certa vez, consultado pelo Departamento de Comércio Exterior de uma dada trading sobre se “haveria algum problema em entregar cópias do BILL OF LADING, enviando-as por e-mail ao comprador”, debruçamos sobre o tema a partir de elementos relevantes: TIPO DE PAGAMENTO INTERNACIONAL, INCOTERM aplicado e PAÍS DE DESTINO da valiosíssima carga de commodities.
A partir do questionamento inicial, checamos um até então não notado grave problema, FOB desalignment with Documentary Collection, e, afinal, constatamos que a aparente inocente remessa de imagens do B/L daria quitação da carga (que estava paga em apenas 30%), visto que, no país de destino, uma nação caribenha subdesenvolvida, por conta de adesão aos termos modelares UNCITRAL, cópias de B/L constituíam quitação e imediata liberação da carga em questão de horas…
Sequestro de Filho e Justiça Internacional
O sequestro de filho será objeto de Justiça Internacional nos casos em que a posse do filho é, fraudulenta ou violentamente, arrebatada a um genitor por outro que, então, coloca-se sob um território de autoridade diferente daquele que, habitualmente, a criança sequestrada está vinculada.
O ponto que atraí o direito internacional privado é, portanto, a confluência de autoridades de soberanias diferentes.
Nada obstante, é essencial uma análise bem acurada. Por vezes, o ato de desapossamento da criança acontece e permanece em um mesmo território e, portanto, sob uma mesma soberania!
Nessa situação, evidentemente, a INTERNACIONALIDADE do acontecimento não determina a competência da Justiça Internacional. Por exemplo, suponha que a genitora guardiã brasileira, residente em São Paulo com o filho, traga a criança ou autorize a sua viagem à Espanha para visitar o genitor que residente nesse país.
Imagine-se que, então, o genitor INVERTA a natureza provisória da permanência com o filho para, então, não restituir a criança à genitora ou não permitir o retorno dela para o Brasil, que é o país de origem.
Nesse caso, embora possa ser aplicada a Convenção de 25 de Outubro de 1980 sobre os aspectos civis do rapto internacional de crianças, o mais apropriado é que seja forjada a solução jurídica nos moldes da legislação de Direito de Família do próprio país Ibérico, à medida que a criança, no caso da ilustração exemplificativa, está no território espanhol e no território espanhol se deu a abdução dela.
De fato, a INTERNACIONALIDADE que determina a atividade profissional da advocacia de Justiça Internacional precisa ser muito bem analisada, o que requer o conhecimento do próprio especialista de Justiça Internacional, pois a ele será mais fácil EXCLUIR a incidência do DIREITO INTERNACIONAL ou mesmo INCLUÍ-LO, dado à especialidade do tema.
Extraterritorialidade e Internacionalidade: Diferenças e Semelhanças
Algumas vezes, o profissional de Justiça Internacional é consultado sobre temas não de internacionalidade, mas de extraterritorialidade. A diferença é sutil e, evidentemente, o consulente não é obrigado a saber a diferença, especialmente porque o liame entre o direito internacional privado e os temas de extraterritorialidade são siameses.
O advogado de Justiça Internacional, certamente, está preparado para enfrentar o problema de extraterritorialidade, porque, na realidade, trata-se de um tema de direito processual doméstico e que, por consequência, não envolve conhecimento especial. Todavia, a questão de Justiça Internacional não poderá ser resolvida pelo advogado sem o conhecimento dessa especialização de direito internacional.
Um problema de Justiça Internacional é aquele cuja solução depende de se aplicar o direito que não é de nenhum Estado especificamente, mas supranacional.
Imagine-se que uma empresa de trading brasileira precisa saber o que fazer para interromper o curso de certas negociações, transmitindo, tecnicamente, que não deseja mais se engajar na planejada compra-e-venda internacional, digamos, de commodities, com uma contraparte dos Emirados Árabes, sem que tal desistência negocial tenha consequências jurídicas.
Nesse caso, a análise da documentação da negociação entre as tradings é de natureza internacional, e não extraterritorial, porque seus relevantes aspectos precisam ser checados, exclusivamente, sob o amparo de que lei internacional estavam as tradings negociando até então e, nenhuma sendo expressa, se há alguma norma internacional que pode ser considerada como tendo sido tacitamente aceita entre as tradings. Ainda, é necessário averiguar se, para a dada negociação que se vinha fazendo, existe algum acordo bilateral entre o Brasil e os Emirados Árabes.
Nota-se que, nesse exemplo das tradings, não se mencionam os direitos nem do Brasil, nem dos Emirados Árabes. Os direitos domésticos dos Estados não têm pertinência.
Suponha-se agora que aquela mesma trading, enquanto estava negociando com a parceira dos Emirados Árabes, precisa redigir um contrato de compra-e-venda internacional indireta (exportação indireta). Esse contrato, embora tenha efeitos extraterritoriais, está à luz do direito brasileiro apenas, de modo que o assunto recai no âmbito o direito doméstico brasileiro. A relação jurídica é entre a trading brasileira e o parceiro dela, que pode ser outra trading brasileira ou até mesmo um produtor. Então, é importante que, entre outras cautelas, tal documento seja oficialmente escrito na língua portuguesa, e não em qualquer idioma estrangeiro, notadamente, em Inglês.
O que faz um Advogado (legal adviser) de Justiça Internacional
A Justiça Internacional é uma especialidade em Direito Internacional; então, o advogado de Justiça Internacional é um profissional jurídico especialista em assuntos de interesse (ou sensíveis de política internacional) dos Estados entre si e com nacionais de outro Estado, os quais são objeto de uma pré-disputa, são potencialmente disputáveis ou já disputados nas instâncias judiciais ou arbitrais internacionais ou, finalmente, temáticas que tenham, de alguma maneira, reflexos jurídicos nas relações externas do Estado. Portanto, como qualquer outro advogado, o especialista em Justiça Internacional assessora, presta consultoria e dá aconselhando na fase não-contenciosa, sem prejuízo de atuar também no âmbito contencioso. Contudo, o advogado especialista em Justiça Internacional, diferentemente do que se vê no plano da disputa doméstica, normalmente, não representa o Estado, mesmo no contencioso; ainda que no curso do processo adjudicatório internacional, o advogado de Justiça Internacional é “visto” ou “concebido” como legal adviser.
Sendo a Justiça Internacional uma Pós-Graduação, pode ela ser cursada por qualquer graduado em nível superior. Todavia, sua utilidade profissional prática é um agregado do Bacharel em Direito mesmo que não esteja habilitado à advocacia, de acordo com as regras de seu país, que podem fazer distintas exigências (cursos, provas ou experiências práticas) para que um bacharel em Direito possa ser um Advogado.
No plano do direito internacional, de qualquer maneira, não existe exigência para que a advocacia, assessoria, consultoria e ou aconselhamento de Justiça Internacional sejam exercidos por advogado, nem por bacharel em Direito. Mesmo perante os tribunais internacionais intergovernamentais ou arbitrais. Ou seja, teoricamente, para falar legalmente por um Estado em um processo perante a Corte Internacional de Justiça, Tribunal do Mar, Corte Permanente de Arbitragem etc., o mandatário do Estado (que é chamado de legal adviser) não precisa ser advogado, nem mesmo Bacharel em Direito. Nada obstante, na prática, aquelas funções são exercidas por advogado com conhecimento de Justiça Internacional.
Tomado o termo Justiça Internacional no seu sentido estrito, o advogado de Justiça Internacional é o conselheiro legal de autoridades designadas pelo Estado, cabendo-lhe orientá-las em assuntos legais de direito internacional, desde a participação em convenções, conferências, encontros e painéis, até no processo de conhecimento e decisão de aderência a tratados ou acordos internacionais. Ainda, o advogado de Justiça Internacional presta assessoria, aconselhamento e consultoria a nível da Diplomacia ou Chancelaria do Estado, subsidiando as autoridades do Estado em termos jurídicos apenas, por exemplo, ao longo de negociações, conciliações, mediações, inquéritos ou consultas.
Em face de um conflito, ainda plano não-contencioso, a função do advogado de Justiça Internacional não é avaliar diplomaticamente o problema, mas orientar a diplomacia sobre as perspectivas e prognósticos jurídicos, positivos e ou negativos, os antecedentes (acaso existentes no direito internacional sobre o problema em tela, seja especificamente entre os Estados em questão ou outros do mesmo continente ou de outra parte qualquer do mundo). Assim, é bem delimitada a função do mandatário de Justiça Internacional, que não é habilitado a aconselhar diretamente sobre questões de cunho diplomáticos ou políticos, mas apenas jurídicos de direito internacional, especialmente, à luz de sua jurisdicionalidade, sendo que a responsabilidade pelas decisões é da autoridade do Estado (agente ou representante).
Encapsulando a atividade de Justiça Internacional pré-contencioso, essa especialidade é limitada aos aspectos muito técnicos do escopo da “jurisdição pré-mérito”, ou seja, sua concentração analítica é sob o prisma da formalidade, das objeções processuais de procedibilidade ou não, esforçando-se para dar um prognóstico de qual será a causa em concreto e qual será a sua probabilidade de transpor, ou não, o portal das preliminares e vir à luz processual de um conhecimento de mérito judicial ou arbitral. Ou seja, é um trabalho de prognóstico de justiciabilidade, o que exige que tenha um conhecimento formal do processo profundo, mas uma ciência superficial do mérito das mais diversas discussões jurídicas a nível Estado-Estado ou Estado-indivíduo. Já no contencioso, o seu trabalho será garantir que o caso não seja levado para o mérito, ou seja meritoriamente conhecido pelos adjudicadores, conforme o caso de interesse do Estado assessorado por ele, evidentemente.
A complexidade do direito internacional público exige alta especialidade, de modo que, normalmente, o advogado de Justiça Internacional trabalhará com o profissional que tem o conhecimento de mérito do conflito em causa, por exemplo, na seara do direito ambiental internacional, dos mais variados aspectos dos direitos humanos e humanitários, do direito marítimo, do comércio entre os Estados etc.
A propósito, o advogado de Justiça Internacional faz parte de uma equipe multidisciplinar, chefiada pela autoridade do Estado, onde há outros profissionais com conhecimentos especiais, tais como oceanógrafos, engenheiros agrimensores, biólogos, estatísticos etc., conforme as exigências do caso e as necessidades da causa.
Nada obstante, é possível que o profissional de Justiça Internacional seja também especialista em algum dos vários ramos da disputa de direito público.
O que é Justiça Internacional academicamente?
Justiça Internacional pode ser explicada a partir de alguns diferentes pontos-de-vista.
Academicamente, de acordo com a Universidade de Londres (U.O.L.), Justiça Internacional é uma especialização cujo objeto são aspectos da jurisdição internacional (isto é, como se resolvem disputas), tanto na área civil (ou não-penal) dos conflitos que envolvem os Estados entre si ou os Estados e os nacionais de outros Estados, além da jurisdição penal internacional.
Então, a Justiça Internacional engloba o estudo dos tribunais e das cortes intergovernamentais, judiciais ou arbitrais (Estado-Estado ou mistas).
De acordo com o programa da U.O.L, os meios diplomáticos de solução de conflitos também fazem parte do estudo da Justiça Internacional, tais como a negociação, a mediação, conciliação, inquérito e bons ofícios.
Na Universidade de Londres, a especialização em Justiça Internacional apresenta a adjudicação como um GÊNERO da solução de conflitos, de modo que a judicialização é uma espécie de adjudicação por juízes internacionais, a qual é colocada como uma espécie ao lado das adjudicações arbitrais públicas (Estado-Estado), mistas (Estado-indivíduo) e comerciais ou privadas (entre particulares), além de outros métodos de solução de disputas diferenciados, considerados não-adjudicatórios, tais como os mecanismos de compliance em convenções multilaterais de meio ambiente (compliance mechanisms in multilateral environmental agreements) e os mecanismos de inspeção in bancos de desenvolvimento internacional (Inspection mechanisms in international development banks).
