- Introdução
- Controvérsia acerca da Penhora de Imóvel Gravado com Alienação Fiduciária em Garantia
- Conceito e Determinação dos “Direitos do Devedor sobre o Imóvel Financiado”
- Decisão de Penhora Determinativa dos Direitos Penhorados
- Caso Consultado Concreto: Vício da Inespecificação e o Princípio da Entropia
- Leilão Judicial “dos direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente”
- “Penhora dos Direitos do Devedor sobre o Imóvel Alienado Fiduciariamente”
- Penhora do Objeto da Prestação do Finaciamento (dinheiro)
- Concurso de Credores: Condomínio e Agente Financiador
- Conclusão: Devedor Achado Insolvente na Execução Condominial
Introdução
Situação que se apresenta com vulgar recorrência nos pretórios é a execução contra condôminos inadimplentes, residentes em unidades autônomas financiadas sobre as quais têm a posse direta, mas a propriedade se encontra sob fidúcia com o agente bancário financiador.
Também é fato notoriamente comum o condômino devedor não dispor de patrimônio, nem liquidez para quitação do débito, nada restando para a penhora da entidade condominial, senão o próprio bem imóvel.
Ainda, é corriqueiro também que o agente fiduciário seja a Caixa Econômica Federal.
Controvérsia acerca da Penhora de Imóvel Gravado com Alienação Fiduciária em Garantia
Está longe de pacificação a controvérsia acerca da legalidade da penhora sobre imóvel fiduciariamente alienado. A propósito, no Proc. REsp nº 1.929.926, essa questão está sendo analisada. Em 1ª Instância, o Magistrado indeferiu a penhora sobre o imóvel alienado fiduciariamente, permitindo, todavia, a “penhora sobre os direitos do devedor sobre o imóvel”. Em grau de recurso, o TJSP reformou a decisão original para permitir a penhora do imóvel, visto a natureza “propter rem” da obrigação condominial.
Não discutiremos aqui a penhora do imóvel, mas a “penhora sobre os direitos do devedor sobre o imóvel”.
Conceito e Determinação dos “Direitos do Devedor sobre o Imóvel Financiado”
O que são “os direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente” e que resultam do contrato de financiamento garantido pela alienação?
Trata-se, na verdade, de um conjunto de direitos de natureza jurídica diversa: Os direitos com origem no Direito das Coisas, resultantes da posse direta (usar, fruir e gozar), e o direito pecuniário decorrente do Direito das Obrigações, consistente nos valores que o fiduciante já pagou para adquirir a propriedade plena do imóvel.
De regra, o que as pessoas têm em mente é a penhora do direito de natureza obrigacional.
Decisão de Penhora Determinativa dos Direitos Penhorados
Assim, quando uma decisão judicial penhora os direitos do condômino devedor, é necessário que ela esclareça quais daqueles direitos ela está vinculando à satisfação do credor exequente, os de ordem real ou obrigacional ou ambos. E isto porque cada uma daquelas naturezas jurídicas determina uma diferente forma de excussão no processo, sendo a omissão judicial indevida por permitir uma ambiguidade excussão. A penhora precisa ser clara quanto ao seu objeto, de modo que precisa seja a sua excussão posterior pelos modos apropriados de alienação judicial forçada.
Caso Consultado Concreto: Vício da Inespecificação e o Princípio da Entropia
No caso que analisamos, a decisão que ordenou a penhora padece exatamente do vício da inespecificação de seu objeto, ou seja, quais “os direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente” em que está incidindo.
Entropia é a medida da desordem de um sistema, sendo que um sistema desordenado tende a se tornar cada vez mais desordenado com o passar do tempo e dos eventos. Ora, sendo o processo judicial um sistema de coisas, o erro da decisão de penhora tem o potencial de acarretar várias outras desordens em cascata.
Não se seguiu à decisão de penhora a sua formalização mediante um termo de penhora lavrado nos autos, o qual deveria, justamente, esclarecer o que estava sendo penhorado (em substituição ao auto de penhora, já que lavrada a penhora no próprio processo, e não fora dele). Essa é, a propósito, a diferença entre termo e auto: Aquele formaliza o ato praticado no cartório ou na sala de audiência, enquanto esse formaliza o ato realizado na rua.
Nessa toada, veio um auto de avaliação pelo Oficial de Justiça que, à míngua de maior clareza nos autos, redigiu uma esquálida avaliação do bem imóvel (quase um milhão e meio de reais), quando, na verdade, a penhora era sobre “os direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente”. Inconsciente da inconsistência, o credor “concorda” com o auto do Oficial de Justiça.
Leilão Judicial “dos direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente”
Em uma escalada de desordens, veio a decisão que manda realizar leilão “dos direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente”. Mas, o que será, realmente, leiloado afinal? Como se leiloam “os direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente”?
O edital (eletrônico) descreve o imóvel alienado fiduciariamente à Caixa Federal e estabelece, para o primeiro leilão, o valor de um milhão e meio e, para o segundo leilão, a metade.
Ora, supondo que algum arrematante tenha a coragem de dar um lanço nesse leilão abstruso e arremate o objeto leiloado, digamos, pela metade do valor do apartamento. O que será alienado ou adjudicado (art. 825, CPC) por quase oitocentos mil reais?
“Penhora dos Direitos do Devedor sobre o Imóvel Alienado Fiduciariamente”
Na realidade, o expediente de se obter a “penhora dos direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente” é tábua de salvação destinado a aflito credor quirografário desesperançado de receber o crédito, mas se agarra à esperança de que, na excussão levada a efeito pelo agente fiduciário, haja alguma “sobra financeira” com a qual possa se satisfazer!
Essa “penhora dos direitos do devedor sobre o imóvel alienado fiduciariamente”, portanto, consumar-se pela averbação no rosto dos autos da execução fiduciária, não sendo, por isso mesmo, suscetível de avaliação ou leilão para alienação forçada, pois seria loucura alienar por leilão um montante financeiro, aliás, cuja existência e valor são incertos!
Na verdade, o agente fiduciário, quando quer recuperar o seu crédito diante do inadimplemento do devedor fiduciante, jamais se serve da demorada e ineficiente execução judicial, mas parte logo para cima do devedor com a rápida consolidação extrajudicial de sua propriedade! Nesse procedimento extrajudicial, a própria entidade financeira “descobre a dívida condominial” que é, automaticamente, incluída no seu rápido leilão extrajudicial.
Penhora do Objeto da Prestação do Finaciamento (dinheiro)
Uma medida de penhora alternativa, e que também serviria de instrumento de pressão sobre o devedor, que quita as parcelas do financiamento, mas tem dívida condominial pendente, é determinar a penhora do dinheiro que o devedor, mensalmente, utiliza para pagamento ao agente financiador. Para tanto, o Juiz expediria intimação pessoal para o devedor determinando que, sob pena de prática de ato contrário à dignidade da Justiça, que, mês a mês, deposite o devedor no processo de execução condominial o dinheiro correspondente à prestação do financiamento. Para maior garantia, idêntica intimação seria dirigida ao agente financeiro, de modo a, então, considerá-lo “depositário” da prestação, caso o devedor descumprisse a determinação judicial.
Concurso de Credores: Condomínio e Agente Financiador
É relevante lembrar que, no caso concreto, o devedor – que paga o financiamento, mas não paga o condomínio – opta, egoisticamente, por um crédito em detrimento de outro, no caso, o condominial, que é preferencial1 em relação a todos os demais créditos que, eventualmente, com ele concorram. Vale dizer que, ao mesmo tempo em que adquire a propriedade, onera aquele devedor os demais condôminos, inclusive, locupletando-se, já que ele consome água, usa das facilidades do prédio comum e deixa para que seus vizinhos paguem por ele. Ao cabo, a comunidade condominial arca com os custos, ao menos em parte, da propriedade que o devedor está adquirindo.
Conclusão: Devedor Achado Insolvente na Execução Condominial
É de hialina clareza que, se no curso da execução por quantia certa contra devedor solvente, o credor condominial se deparar com a insolvabilidade de fato do condômino, resta-lhe aditar subjetivamente a execução para nela incluir o proprietário fiduciário. Sendo o agente financeiro a Caixa Federal, essa adição subjetiva desloca a competência da Justiça Estadual para a Justiça Federal. Daí por diante, segue a citação do proprietário fiduciário para pagar e, não havendo pagamento, a subsequente penhora, avaliação e alienação judicial forçada do imóvel.