Justiça Internacional e a relação dos Estados com seus Juízes

Relação dos Estados com os seus Juízes: Introdução

Os Estados Democráticos de Direito têm, internacionalmente, obrigações para com a democracia no âmbito doméstico da relação dos Poderes com os Juízes. Isto significa que o desrespeito à autoridade judiciária de um Estado é objeto de conhecimento e pode ser censurado pelos órgãos judiciais internacionais, conforme o caso concreto. A esse particular respeito, podemos citar, na União Europeia, “Polish judges in Juszczyszyn v. Poland and Tuleya v. Poland.

Interessante e holística leitura sobre o tema: “International Principles on the Independence and Accountability of Judges, Lawyers and Prosecutors – A Practitioners´ Guide”, o qual nos revela que a independência para a Justiça não é apenas a do Juiz que importa, mas também a do Advogado e do Promotor, posto que todos são peças do dialético sistema judiciário democrático. Sendo mútuo o respeito e guardadas as posições das funções no processo e na audiência, ninguém é maior que ninguém.

Em uma palavra, o Estado que desrespeita seus Juízes comete infração às suas obrigações internacionais. Consequentemente, está sujeito a uma ação perante a Justiça Internacional.

O caso da prisão da Juíza de 1ª Instância Estadual Hannah Dugan, em Milwaukee

O sistema judiciário norte-americano, relativamente estruturado à semelhança do Britânico, segue um modelo próprio do Common Law que não pode ser comparado ao do Brasil. A Juíza em questão, embora Magistrada investida com poderes jurisdicionais, não poderia ser comparada aos Juízes Estaduais brasileiros, muito menos a relação dos Juízes entre si mesmos nos Estados Unidos com o que acontece no Brasil, por exemplo, entre Juízes Estaduais de lá e os Federais.

Feita essa distinção, o caso Hannah Dugan é uma excentricidade, mas não uma novidade, notadamente, ao longo dos mandatos de Trump, caracterizados pela força e polarismo.

Muito similar foi a prisão de uma Juíza de Massachusetts durante a primeira administração de Trump (2017-2021), Shelley Joseph.

Em 2018, no caso de Shelley, iniciado em 2019, os Promotores do caso concordaram em não a acusar em 2022. Agora, em 2 de Dezembro de 2024, o órgão correicional instaurou um procedimento administrativo contra Shelley sobre aquela sua conduta em 2018.

Houve Expedição de Mandado de Prisão contra a Juíza Hannah Dugan? A “Causa Provável”

Não, mas isso não é ilegal, não contraria o devido processo legal (federal) estadunidense, a princípio, e é passível de análise de abuso de autoridade. De fato, a interpretação jurisprudencial da Quarta Emenda à Constituição Federal Americana, de forma geral, abre exceção à condição de prisão (fora de flagrante, evidentemente) sem mandado judicial, por exemplo, na situação da CAUSA PROVÁVEL, o que justifica, em tese, a prisão federal sem um mandado da Juíza. 

Como a prisão da Juíza Hannah Dugan foi realizada sem um mandado de prisão, podemos assumir que os agentes do FBI se apoiaram na escusa de que a prisão, afora amparada pela causa provável, também foi orientada pela circunstância exigente de ir buscar a Juíza no Fórum, às oito horas da manhã, onde ela estava a trabalho. Aqui, está o ponto nevrálgico e, talvez, político da questão…

Nota-se, outrossim, que circunstância exigente não equivale à situação de prisão em flagrante, mesmo no sistema norte-americano. Para ler um pouco mais sobre a doutrina da circunstância exigente e da prisão em flagrante (hot pursuit): Exigent Circumstances: Hot Pursuit – Criminal Procedure: Undergraduate Edition e The Supreme Court Weighs in on the ‘Hot Pursuit’ Doctrine.

A conduta da Juíza, usando de seu poder, não pareceu correta e, assim, a administração federal, também usando de seu poder, não foi correta, ao que parece, levando o jogo para um empate de 1×1 em termos de ilegalidade.

Qualquer que tenha sido a conduta da Juíza Hannah Dugan agora, 04/2025, em Milwaukee, ou a de Shelley Joseph (Massachusetts, em 2018), as condutas que elas exerceram estavam fora dos autos, embora no Fórum, valendo-se do encastelamento judicial.

Qualquer Juiz pode, nos autos, por escrito, assinando embaixo, tomar a decisão que entender a mais justa diante do caso que, constitucionalmente, foi-lhe apresentado de acordo com as leis do seu país.

Nenhum Juiz pode, todavia, agir com o poder de Juiz fora dos autos, porque o poder judicial é limitado pelos autos, mas a obrigação de Juiz o segue 24 horas, em termos de compostura.

Conclusão

Como Advogado Internacionalista, eu não acho que o caso das Juízas americanas sejam situações em que o Direito Internacional foi, a princípio, violado, mas são fatos relevantes internacionalmente para medir a “temperatura” política nos Estados Unidos e indicar como é importante o Juiz “não se envolver pessoalmente em política”, não ter rede sociais em que se exponha e, sobretudo, não agir como Juiz fora dos autos, especialmente, em questões políticas.

Da mesma forma que um Juiz americano tem compensações públicas que o distinguem das pessoas que não exercem a mesma função relevante, é natural que deles se tirem liberdades que aquelas mesmas pessoas comuns têm, nomeadamente, em redes sociais.

A questão do cuidado com a integridade judicial e a manutenção da confiança pública nos Juízes, em face dos riscos de exposição em redes sociais, não são temas setoriais dos Estados Unidos, mas mundiais e deles se ocupa a própria Nações Unidas. Essa preocupação reflete os anseios sociais em todos os cantos do mundo, como na Europa. (1)

O ano passado, um Juiz japonês perdeu o cargo após considerada abusiva sua participação com opiniões comprometedoras em rede social.

No contexto desse problema, de certa forma, encontram-se os desdobramentos do caso da Juíza Hannah Dugan.

 

 

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